Sola Scriptura na busca da verdade

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

O Batismo com o Espírito Santo nas profecias de João Batista

A compreensão do pentecostalismo clássico a respeito do Batismo com o Espírito Santo é que ele é um revestimento de poder que sobrevém ao crente após a sua conversão e que tem a finalidade de dar uma capacidade maior para que o crente seja testemunha de Cristo e que resulta numa vida mais consagrada a Deus. Para embasar este ensino geralmente são citados versículos como Atos 1.8 e Lucas 24.49. No entanto, para que tenhamos uma compreensão abrangente desta doutrina precisamos de um exame mais completo e que também aborde as origens da expressão “batismo com o Espírito Santo” e a maneira como ela foi usada por expoentes como Jesus Cristo, João Batista e os apóstolos Pedro e Paulo.

Essa expressão ocorre apenas sete vezes no Novo Testamento (Mt. 3.11; Mc. 1.8; Lc. 3.16; Jo. 1.26; At. 1.5; 11.16; 1 Co. 12.13). A última referência (1 Co. 12.13) é um tanto diferente das outras em sua construção gramatical, o que em minha opinião, não se refere a uma obra diferente por parte do Espírito no crente mas apenas enfatiza um outro aspecto dessa obra que é o de integrar o crente no corpo de Cristo, sua igreja.

No entanto, não é nosso objetivo fazer aqui uma abordagem exaustiva a respeito dessa doutrina e sim apresentar a devida compreensão dela apenas nas profecias de João Batista que foi o precursor do ministério terreno de Cristo (Mt. 3.1-3 ). Com raras exceções, durante dezoito séculos a igreja cristã tem compreendido que o batismo com o Espírito Santo é a obra de Cristo em conceder o seu Espírito à igreja, ao seu povo e que isso ocorre no momento em que o crente é salvo. Apenas no final do século XIX, com o advento movimento pentecostal essa compreensão foi mudada em alguns ramos do protestantismo, passando a se entender o batismo com o Espírito como uma segunda obra da graça que acontece após a regeneração.

A primeira referência ao batismo com Espírito Santo no Novo Testamento é encontrada no Evangelho de Mateus 3.11 que diz: “Eu vos batizo com água pra arrependimento; mas aquele que vem depois de mim é mais poderoso do que eu, cujas sandálias não sou digo de levar. Ele vos batizará com o Espírito Santo e com fogo (ARA; itálico do autor). Para se ter um correto entendimento do que esse versículo quer dizer, deve-se fazer uma análise, ainda que breve do contexto dessa passagem.

O capitulo 3 do evangelho de Mateus inicia-se com uma referência a João Batista como sendo o precursor do ministério de Cristo prometido no Antigo Testamento (3.3; Is. 40.3). Em seguida faz-se referência ao estilo de vida do profeta que usava vestes de pêlos de camelos, cinto de couro e se alimentava de mel silvestre (v. 4). João Batista pregava na Judéia e nas circunvizinhanças do Rio Jordão e batizava aqueles que se arrependiam e confessavam seus pecados (vv. 5-6). Quando, porém notou que alguns fariseus e saduceus vinham ao batismo (v. 7) iniciou uma pregação interessante para o nosso propósito. João Batista os mandou produzir frutos dignos de arrependimento (v. 8). O arrependimento é algo extremamente necessário para um pecador obter perdão de seus pecados (At. 3.19; 17.30). Note então, que a pregação de João Batista inicia-se com um apelo ao arrependimento e não a algo que se obtenha após ele, ou seja, após sua conversão.

João Batista ensina claramente que o simples fato de ser descendente biológico de Abraão, o grande patriarca com quem Deus estabeleceu sua aliança, não é garantia de salvação (v. 9) e em seguida faz uma advertência muito séria. João Batista traz uma mensagem de condenação dizendo: “Já está posto o machado à raiz das árvores; toda árvore, pois, que não produz bom fruto, é cortada e lançada no fogo” (ARA). É claro que essa expressão é uma referência ao juízo de Deus sobre os impenitentes pecadores e que a referência ao fogo (algo tão aclamado no movimento pentecostal) pelo menos nesse texto, não tem o sentido de poder benéfico, agitação emocional ou coisas desse tipo, mas um sentido de juízo e de condenação. Toda árvore, ou seja, toda pessoa do povo visível de Deus (Israel/Igreja), que não se coaduna com os princípios do Reino de Deus receberá justa condenação por isso, sendo cortada e lançada ao fogo.

Diante da perspectiva do versículo anterior é que devemos entender o versículo 11. João Batista diz que assim como ele mesmo batizava com água, assim também Cristo batizará os seus (aqueles que se arrependeram e produziram frutos de arrependimento v. 8) com o Espírito Santo, e os pecadores impenitentes e não arrependidos com fogo. Alguns comentaristas vêem o fogo aqui, como uma referência a purificação do crente no momento da regeneração. É verdade que o fogo algumas vezes é usado como uma referência a purificação no Novo Testamento. Assim como o fogo refina o ouro, assim também a abra do Espírito em nossas vidas nos aperfeiçoa (cf. 1 Pe. 1.7). Mas pelo contexto isso não parece ser provável, pois o fogo tem um claro sentido de juízo tanto no versículo 10 como no versículo 12. Algo importante a se notar também, é que o fogo é apenas mencionado em Mateus e Lucas, onde se menciona juízo por parte do Messias. Nos evangelhos de Marcos e João o fogo não mencionado e coincidentemente a menção de juízo também não é feita (cf. Mc. 1.2-8; Jo. 1.19-34). Nas ocorrências em Atos o fogo também não é mencionado (At. 1.5; 11.16). Alguns apelam para o fato de ser mencionado “línguas repartidas como que de fogo” em Atos 2.3 e relacionam-nas a profecia de João Batista, mas essa não parece ser uma inferência justa, pois se fosse assim, essas línguas (no exato modelo de Atos) deveriam aparecer quando todo crente que fosse “batizado com Espírito Santo”.

O relato de Lucas acerca do testemunho de João Batista é parecido com o de Mateus. A fora as informações sobre a data, governadores e sacerdotes contidas nos versículos 1 e 2 o relato é idêntico. Lucas identifica João Batista como sendo o precursor do Messias prometido no Antigo Testamento (vv. 4-5) e inicia sua pregação a respeito do arrependimento após ver as multidões que viam ser batizadas (no relato de Mateus a referência é feita aos fariseus). Lucas registra a sua menção aos frutos de arrependimento, ou seja, ações que evidenciassem que eles de fato se arrependeram e sua objeção a crença de que os judeus seriam salvos por serem descendentes de Abraão (v. 8). O evangelista registra também a advertência sobre o juízo de Deus que seria como um machado cortando as árvores que não dão fruto (v. 10). Lucas menciona algo que Mateus não nos revela. Os conselhos sobre a divisão de pertences como comida e túnicas, para que os publicanos não cobrassem mais do que o estipulado e para que os soldados se contentarem com seu salário (vv. 10-14) não são descritos por Mateus.

Após ser questionado se era o Messias, João Batista responde que não, e diz que o Messias seria maior do que ele, pois João batizava com água, mas o Messias batizaria com o “Espírito Santo e com fogo” (vv. 15-16). Em nosso exame da passagem de Mateus, vimos que o fogo ali, claramente significa juízo. Aqui isso parece estar patente também, pois o fogo é mencionado no versículo 9 onde claramente tem um sentido de juízo e não de purificação. Por outro lado o versículo 17 menciona que enquanto o Messias limpa a eira e recolhe o trigo no celeiro, também queimará a palha em fogo inextinguível. Somos tentados a interpretar o trigo e a palha como duas classes de pessoas, aquelas que serão salvas e aquelas que serão condenadas e queimadas no fogo. Essa é a mesma idéia que encontramos em Mateus 3.12. Limpar a eira simboliza a obra de regeneração, recolher o trigo no celeiro refere-se à salvação final dos santos e queimar a palha no fogo refere-se a condenação dos pecadores que não receberam o Messias.

O relato de Marcos sobre João Batista é o mais breve de todos os quatro evangelhos. Ele apenas menciona João Batista como um cumprimento de profecias do Antigo Testamento, que batizava pessoas que confessavam seus pecados e que pregava que o messias viria e não apenas batizaria com água, mas com o Espírito Santo (Mc. 1 2-8). O fogo não é mencionado, assim como o juízo e a condenação também não. No relato de João semelhantemente o juízo também é mencionado assim como o fogo, e João usa apenas a expressão “batismo no Espírito Santo”.

Fica claro então, por um exame simples dos relatos dos evangelhos sobre João Batista, que a expressão “batizar com o Espírito Santo” é uma referência a regeneração e que o “fogo” é uma referencia ao juízo que Deus trará sobre os pecadores impenitentes. Nada é nos dito sobre alguma obra posterior a salvação, uma segunda obra da graça. Portanto devemos nos apegar as Escrituras para estarmos cientes da verdadeira obra do Espírito Santo em nossa vida. É claro que não devemos viver numa ortodoxia morta, e que nem sempre as emoções são algo negativo, mas nossas experiências devem passar pelo crivo da Bíblia e não o contrario. Não devemos crer em algo por tradição ou experiência, mas por convicção bíblica.